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Entrevistas

Mestrado exige publicação de Artigo

 

Professor Phd Salvador Trevizan, coordenador do Mestrado de Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente da UESC, em 18/04/2011.

Salvador Dal Pozzo Trevizan possui graduação em Filosofia pela Universidade de Passo Fundo(RS), mestrado em Sociologia Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutorado em Sociologia pela University of Wisconsin - Madison (USA). É orientador em cursos de Mestrado e Doutorado na área ambiental. Durante muitos anos foi funcionário da Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira) e atuou, por dois anos e meio, como Chefe de Gabinete e Coordenador Executivo do Gabinete da Secretaria de Estado de Educação da Bahia. Atualmente é Professor Pleno da UESC.

 











 

Núcleo Web - Professor Trevizan, como o senhor avalia o Mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente nesses 12 anos de trajetória?

Professor Salvador Trevizan - Eu diria que foram doze anos de uma contínua aprendizagem. No período em que surgiu esse mestrado, no Brasil as questões ambientais ainda estavam começando no âmbito mais acadêmico. Hoje no meio da população, você ouve as discussões na rua, crianças na escola tratam dessas questões ambientais. Quando o curso foi montado se tinha a vontade, a expectativa de desenvolver pesquisas e fazer extensão para transformar a realidade que se estava vendo por um caminho não mais desejado, ou seja, a destruição dos recursos que são fundamentais para a nossa sobrevivência. Então, o curso nasceu com essa vontade de querer mudar o trânsito das coisas, mas não se tinha clareza a respeito de como fazer. Por exemplo, é um curso interdisciplinar, porque as questões ambientais envolvem áreas diferenciadas do conhecimento e não se pode trabalhar uma questão ambiental com uma abordagem disciplinar. No nosso curso, a questão ambiental está ligada a desenvolvimento. Então, como é fazer um curso interdisciplinar tratando de questões ambientais voltadas ao desenvolvimento? É nesse sentido que eu digo, foram 12 anos de aprendizagem constante. Houve erros, houve acertos e acho que nós crescemos bastante. Eu diria que hoje estamos numa fase de consolidação, no sentido de sabermos o que queremos e de como fazer.

Núcleo Web - Na sua opinião professor, quais as principais contribuições do mestrado para o desenvolvimento regional?

Professor Salvador Trevizan - A meu ver, uma contribuição inquestionável é a formação de profissionais para trabalhar em instituições e com temas que dizem respeito ao meio ambiente; gestão de unidades de conservação; assessoria às prefeituras dos municípios na região para planejar, definir políticas e ações na área ambiental; consultorias em temas ambientais, são alguns exemplos. A contribuição da formação de profissionais com conhecimento na área ambiental é um fato concreto. Outra grande contribuição foi a produção do conhecimento. Todos esses estudantes que passaram pelo curso, junto com os professores, deixaram conhecimentos através das pesquisas, novos conhecimentos, principalmente das questões ambientais na região. Uma universidade tem essa tarefa de produzir conhecimentos específicos para a região, para definir também políticas especificas e não apenas no conhecimento genérico, geral, que vale para todo mundo e não se aplica para nada. Então, a formação de profissionais na área ambiental e a produção de conhecimentos foram as duas contribuições de maior evidência.

Núcleo Web - E quais são as linhas de pesquisa do curso?

Professor Salvador Trevizan - Hoje nós temos quatro grandes linhas, uma delas é sobre Uso de Recursos Naturais; outra, Comunidades Sustentáveis, que visa desenvolver estudos para a organização de comunidades mais sustentáveis; uma terceira é Planejamento e Gestão de Bacias Hidrográficas e Zonas Costeiras; e a quarta, Qualidade Ambiental e Saúde. As propostas de pesquisa dos estudantes são selecionadas à medida que procuram responder dúvidas que persistem nessas quatro linhas.

Núcleo Web - E quantos grupos de pesquisa da Universidade participam atualmente do Programa?

Professor Salvador Trevizan - Eu responderia fazendo referência aos departamentos que tem professores envolvidos neste curso. Nós temos sete departamentos que tem professores dando aulas, orientando dissertações e desenvolvendo projetos específicos dentro da sua especialidade. A quantidade de departamentos envolvidos no curso, de certa forma, resulta da interdisciplinaridade que caracteriza o curso. Hoje, todas as áreas do conhecimento têm interesses e tratam de questões ambientais. Nem todos os departamentos têm a mesma participação. Os departamentos com maior representação, em termos de número de professores, são o Departamento de Ciências Agrárias e Ambientais (DCAA), o Departamento de Ciências Exatas e Tecnológicas (DCET) e o Departamento de Ciências Biológicas (DEBIO). No aspecto administrativo, o Mestrado tem sido vinculado, no início, ao DCAA e ao DEBIO. Professores e alunos destas duas áreas predominaram durante um certo tempo. Mas como a estrutura do curso é dinâmica, hoje, o DCET está em segundo lugar na quantidade de professores que colaboram com esse Mestrado.

Núcleo Web - Professor, quantos alunos já passaram pelo curso e qual o perfil deles de modo geral?

Professor Salvador Trevizan - Eu vou me basear nas dissertações defendidas. É claro que, desde o início do curso, um ou outro aluno desistiu, não concluiu ou por alguma razão se perdeu pelo caminho. Mas até 31 de março (2011), 246 dissertações tinham sido defendidas e aprovadas. Falta-nos, porém, publicar mais os resultados dessas dissertações. O colegiado está empenhado nessa tarefa. Foi com esta perspectiva que o Colegiado do Curso, em 2008, propôs uma reformulação no Regimento do Curso, exigindo a publicação de, pelo menos, um artigo, para poder defender a dissertação. O percentual dos que desistem sem concluir sua dissertação tem sido inferior a 5%. Hoje (31.03.2011) temos 60 alunos matriculados, alguns estão em fase conclusiva. Alguns dados mostram as áreas de conhecimento desses alunos, a origem em termos de formação. A Biologia e a Geografia foram as áreas que mais contribuíram com estudantes neste curso. Mas as demandas vêm de quase todas as áreas, como Agronomia, Direito, Economia, Administração, Zootecnia, Enfermagem, Pedagogia, Medicina e outras com menor participação.

Núcleo Web - Agora, falando de outro assunto, que tipo de influência a implantação do Doutorado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente deve exercer sobre o mestrado?

Professor Salvador Trevizan - A nossa expectativa é que o doutorado contribua em qualidade de ensino e pesquisa no mestrado e em qualidade e quantidade de publicação, divulgação dos resultados produzidos. Essa é a nossa grande expectativa. Mas esse esforço ainda está sendo feito. É claro, o doutorado está em seu começo, estamos no início da segunda turma. As coisas estão estruturadas para que dêem certo e vamos trabalhar nesse sentido.

Núcleo Web - Professor Trevizan, tornou-se polêmico o projeto de construção do Complexo Intermodal em Ilhéus, com a previsão de um porto, um novo aeroporto e ferrovia na zona litorânea da cidade. Qual a sua opinião sobre esse projeto?

Professor Salvador Trevizan - Eu vejo de uma maneira natural toda essa polêmica que tem sido gerada em torno desses projetos do Governo. A sociedade faz escolhas e toda escolha tem um preço, tem um benefício. O desejo é que o benefício seja maior do que o custo. É claro que todos nós vivenciamos um conflito dentro da sociedade com relação às propostas do Governo, alguns se opondo e outros querendo que isso aconteça. A meu ver, o discurso gerado pelos que se opõem aos projetos do Governo não foram suficientemente convincente para mudar a opinião pública da sociedade regional em se colocar contra os projetos do Governo. A meu ver, esse debate é rico, traz vantagens para o meio ambiente. O conflito, as discussões, pelo menos, obrigam as empresas e ao próprio governo a buscar amenizar os impactos negativos do projeto, a olhar as questões que podem estar associadas a todos esses grandes projetos da Bahia. O certo é que, se houvesse um plebiscito regional, colocando a sociedade a favor ou contra, eu duvido que a sociedade votaria contra. É claro que a sociedade não quer a degradação. Quem argumenta contra os projetos, poderia responder: “Mas, a sociedade não está informada”. Esse é um risco que nós corremos. A nossa tarefa é de informar os prós e os contras. Nós somos conseqüência da sociedade em que vivemos. Precisamos também tomar consciência de que o ser humano faz parte da dinâmica do ambiente. Nós, humanos, disputamos espaços com a vegetação, disputamos alimentos com os animais. Mas nós, os animais e as plantas, somos parte do mesmo ecossistema. O que o ser humano tem a mais é essa capacidade de pensar, de produzir tecnologia, que pode vir contra ele, e tem vindo até agora. Porque, até hoje, a ciência e a tecnologia foram produzidas sem pensar no futuro. Tudo tem sido feito a partir do imediatismo e, de repente, nós nos damos conta que estamos cavando o nosso buraco. É essa consciência que a sociedade vem tomando que faz com que despertemos para redirecionar as nossas ações e isso os animais, as plantas não sabem fazer. O que eles fazem - e são seres vivos - é aquilo que a força da natureza instintiva pode fazer. Mas o ser humano, além de instintivo, tem a capacidade de pensar, de criticar, de refletir. Só que nem sempre a crítica vem no tempo oportuno. Enfim, nós vivemos numa sociedade que está mais ou menos preocupada com certas questões e esse nível de preocupação temos que levar em consideração. Temos que “viajar” no sentido de construir sonhos para melhorar, mas temos de viajar com os pés nos chão. Essa é a realidade e a realidade às vezes é dura de ser roída. Pode ser boa para uns, pode não ser agradável para muitos, mas nós temos que conviver e não nos conformar. Eu não posso me conformar com alguma coisa porque não tem jeito. Tudo tem jeito na vida, mas nós precisamos ir trabalhando para transformar o que precisa ser transformado. Não se pode passar com um trator por cima da realidade social. Estamos diante de uma proposta do Governo e de uma sociedade que dominantemente quer esses projetos, e tem suas razões para isto. A sociedade vê nos projetos do governo alternativas de crescimento, de emprego, de possibilidades de melhoria das condições de vida. As questões ambientais ainda não ocupam aspectos vitais para a sociedade. Enquanto isto não acontecer, o que importa são questões mais imediatas. A luta pela sobrevivência é a primeira força da natureza que move os seres vivos. Os animais lutam pela sobrevivência, as plantas lutam pela sua sobrevivência. Quando nós, humanos, tivermos resolvido o problema da sobrevivência, partiremos para outras questões. Enquanto o problema da sobrevivência estiver nos ameaçando, nós vamos nos mobilizar para resolver isso. Eu vejo as questões ambientais como questões de luta pela sobrevivência. A força da natureza é inesperada e não há ainda tecnologia capaz de conter tal força. A melhor forma de controlar as forças da natureza é convier em paz com elas. Mas a sociedade precisa estar convencida disto, no discurso e na prática. O movimento que se opõe às propostas do governo desempenha um papel relevante, trazendo para a reflexão algumas questões ambientais, chamar atenção para sua relevância, e forçar medidas mitigadoras dos impactos negativos. Assim como o movimento ambientalista deve defender os interesses da sociedade, alertar contra os discursos enganosos, e jamais colocar-se contra ela, o discurso ambientalista também precisa ser monitorado porque não está livre de ideologias que buscam atender interesses de grupos minoritários.

Núcleo Web - Nesse sentido, quais são os desafios do curso de mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente?

Professor Salvador Trevizan - Esse desafio eu resumiria em um número: para 2013 eu quero 5. Cinco é o conceito da CAPES. Hoje nós temos quatro. Nós estamos trabalhando para em 2013 podermos ter atingir conceito 5. Mas, para nós, um curso de mestrado no interior do país, no interior da Bahia, no Nordeste, não é uma tarefa fácil. É claro que para progredirmos precisamos melhorar a qualidade da produção científica e divulgação dos trabalhos de pesquisa, mas não podemos ser ingênuos e pensar que o conceito não esteja carregado de fortes componentes de natureza política; trata-se de uma disputa de poder e, nesta disputa, nós não estamos numa posição privilegiada. Mas estamos atuando no que é de nosso alcance. Insistimos para que cada dissertação, na hora da defesa, tenha também um artigo encaminhado para publicação em revista bem avaliada junto à CAPES, com a participação do orientador. Se garantirmos isso, acredito que nós chegaremos lá. O problema nosso é que, nessa nossa história de 12 anos, pouca preocupação havia no passado em publicar o que se produzia. A modificação no regimento do curso introduziu nova perspectiva. O fato da área de Meio Ambiente e da área Interdisciplinar serem relativamente novas na CAPES, também cria dificuldades na hora da avaliação. Os indicadores de avaliação ainda não são bem definidos, dependendo muito de subjetividades e de interpretações pouco consistentes. Assim, quem está avaliando pode não ter a mesma compreensão de quem está atuando na área. Mas essas dificuldades não interferem na opção que fazemos pela área em que atuamos. Apesar das pedras no caminho, lutamos por ideais e nos empenharemos para obter a meta estabelecida. Conquistar um número parece pouco, mas esse número traz junto de si muita coisa em termos de qualidade e de quantidade de produção.

Núcleo Web - Agora eu perguntaria, qual conselho o senhor daria aos interessados em participar do programa de mestrado?

Professor Salvador Trevizan - Essa é uma questão interessante. De um modo geral, a gente vê os estudantes se inscrevendo para a seleção no Mestrado com uma proposta de pesquisa que eles gostariam de desenvolver. Às vezes, são projetos bem elaborados e acabam frustrados com a desclassificação. É preciso ficar claro que o projeto de pesquisa é apenas um item analisado na seleção, mas o projeto do aluno deve estar em concordância com as linhas de pesquisa do curso e com os projetos de pesquisa dos orientadores. O aluno deve entrar no programa de Pós-Graduação para somar com os professores na produção científica. Por isso, eu recomendaria que todo o estudante que desejar concorrer para ingressar no Mestrado ou Doutorado, procure se familiarizar com as pesquisas que estão sendo desenvolvidas no programa. Só a partir desse envolvimento o estudante pense em elaborar seu projeto. O contacto prévio com o professor que coordena pesquisas numa linha não garante o ingresso do aluno, mas ajuda para que sua proposta não esteja desvinculada do programa. Outro ponto fundamental é estudar inglês. Atualmente, habilidade na compreensão de textos publicados em inglês tornou-se quesito eliminatório no processo seletivo. Tem-se observado nos últimos processos seletivos que poucos são os candidatos preparados para atender a esse quesito. Alguém poderia questionar “mas por que inglês?” A resposta é simples. Não se trata de introduzir dificuldades no processo seletivo; trata-se de selecionar estudantes que aproveitem melhor o curso e sejam produtivos futuramente. As publicações científicas que predominam são em inglês. Portanto, não temos escolha; estamos jogados num mar tempestuoso e é nele que temos que navegar e sobreviver. Em anos passados exigia-se proficiência em inglês no final do curso. Isto não faz sentido. O inglês é para ser utilizado no curso; é uma ferramenta de trabalho.
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